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Direito sindical: desafios em tempos de uberização e trabalho remoto

Captura de tela de reunião, realizada de maneira telepresencial, via Zoom.
Reunião, realizada de maneira telepresencial, via Zoom

O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região realizou, em parceria com a Escola Judicial do TRT24, o evento “Direito Sindical”, na última sexta-feira (16). De iniciativa do presidente do tribunal, desembargador André Oliveira, o evento teve como objetivo dar continuidade ao diálogo entre MPT-MS, TRT, OAB-MS e entidades sindicais iniciado em maio, durante o Mês Regional da Conciliação.

O presidente do TRT/MS, desembargador André Oliveira, fez a abertura dos trabalhos. O magistrado expressou a satisfação do tribunal em realizar o evento sobre direito sindical, “um dos mais importantes temas da atualidade relativo à representação de empregados e empregadores no âmbito das relações capital e trabalho”. O desembargador apresentou os temas das palestras, seus expositores e debatedores e ponderou que as explanações “buscam enfocar o tema em toda a sua amplitude e profundidade no sentido de permitir reflexões a respeito do momento que vivemos e das perspectivas do direito sindical”.

 

Captura de tela de reunião, realizada de maneira telepresencial, via Zoom.
Procurador do MPT-MS, Leontino Ferreira de Lima Junior e juíza do Trabalho Thereza Christina Nahas

 

A primeira palestrante, juíza do Trabalho Thereza Christina Nahas, professora doutora em Direito do Trabalho e integrante da Academia Brasileira de Direito do Trabalho fez um panorama da situação do trabalho e do sindicalismo por meio da palestra “As perspectivas do sindicalismo no Brasil e no mundo”. O debatedor foi o procurador do MPT-MS, Leontino Ferreira de Lima Junior.

A magistrada apresentou uma linha temporal da evolução da representação legal dos trabalhadores, desde a sociedade pré-industrial, com os grêmios, até chegar à sociedade da digitalização, com uma comunidade de trabalho sem autoridade única, descentralizada e com a perda do âmbito temporal e geográfico que, de regional passa a ser supranacional. 

Thereza Nahas citou alguns trechos da Declaração do Centenário da OIT de 2019, com os fatores que repercutem no mundo do trabalho: a mundialização - pessoas trabalhando além das fronteiras e de modo remoto; a evolução demográfica e a movimentação de trabalhadores, acentuada após a pandemia de Covid-19. “Durante a pandemia, o Judiciário brasileiro foi um dos poucos no mundo que não parou. Temos o PJe, nosso sistema bancário é muito avançado. Tudo isso reflete em como as organizações sindicais deveriam se organizar”, explicou.

 

Captura de tela de reunião, realizada de maneira telepresencial, via Zoom.
Professora doutora em Direito Francesca Columbu

 

A segunda palestra “Direito Sindical Comparado: a organização e ação sindical na Itália”, da professora doutora em Direito da Universidade Mackenzie de Campinas/SP, Francesca Columbu, apresentou o sistema jurídico sindical na Itália desde seus primórdios, em 1882, com a liberdade de associação e de greve. “Na Itália, o movimento sindical surge combatendo uma resistência do estado ao fenômeno da afirmação coletiva de quem trabalha”, observou. O debatedor foi o advogado Alexandre Morais Cantero.

A pesquisadora contou a trajetória do sindicalismo na Itália: o freio imposto a esse desenvolvimento pela chegada ao poder do regime fascista e de Mussolini, a garantia constitucional da organização sindical italiana que, apesar de livre, demandava uma estrutura prévia prevista para essas organizações, até chegar ao modelo de sindicato atual. “O modelo atual, pluralítisco-conflitual, ainda que caótico do ponto de vista jurídico, é melhor que o um sistema de segurança jurídica autoritário, como foi no passado”, pontuou.

 

Captura de tela de reunião, realizada de maneira telepresencial, via Zoom.
Advogado Alexandre Morais Cantero

 

Outra característica do sindicalismo italiano é a ausência de normas jurídicas (anomia). Então, na Itália, o direito sindical utiliza-se do Estatuto dos Trabalhadores, da interpretação e das mudanças sociais e decisões da corte. Francesca Columbu ainda apresentou os tipos de instrumentos normativos dos sindicatos, falou sobre representatividade e competição entre sindicatos da mesma categoria. As condutas de repressão e o custeio do sistema sindical italiano também foram pontuados.

No período vespertino, o doutor em Sociologia do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da UNICAMP/SP, professor Ricardo Antunes, trouxe para debate o questionamento “Há futuro para os sindicatos na era do trabalho digital?”. O professor fez um resgate das mudanças profundas sofridas pelo sindicalismo com a mudança da indústria do século XIX para o XX, com a explosão do Taylorismo e Fordismo, que transformou o padrão de produção da indústria.

 

Captura de tela de reunião, realizada de maneira telepresencial, via Zoom.
Professor Ricardo Antunes


Para o pesquisador, o ano de 1973 marca uma crise estrutural muito profunda no capitalismo e a partir daí, todo o processo de produção passa a ter como base a indústria toyotista. “Na virada do século XX para XXI, nós adentramos na era do mundo do capitalismo informacional digital. É importante lembrar que esse capitalismo trouxe um desemprego estrutural de grande amplitude e em escala global. Sem compreendermos o desemprego estrutural global, não entendemos o trabalho em plataformas e uberizado: que foi conduzido por um ideário neoliberal, uma hegemonia financeira onde o trabalho é entendido como custo. E esse intenso avanço técnico informacional digital, que começa com a Toyota no Japão, se estende para o ocidente na década de 1970.”

Desde então, grandes empresas começam a se desenvolver, como Amazon, Facebook, Airbnb, e o trabalho digital não pára de se expandir. Contudo, como ressalta o professor, “nenhum smartphone poderia existir sem a interação com as atividades humanas, inclusive aquelas que nos remetem as formas mais rudimentares de trabalho, com a extração mineral”.

 

Captura de tela de reunião, realizada de maneira telepresencial, via Zoom.
Presidente do TRT MS, André Luiz Moraes de Oliveira


O pesquisador contou, também, sobre as longas jornadas dos trabalhadores digitais e da 'economia dos bicos' dos trabalhadores informais, “todos metaforseados em prestadores de serviços e autônomos”, mas que são, na verdade, uberizados, trabalhadores desprovidos de direito. “As consequências para o plano sindical são imensas. Esse capitalismo não aceita a convivência com o sindicato”, afirmou.

 

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Advogado e mestre em Direiro Carlos Eduardo Dantas Costa

 

A última palestra da tarde foi a do advogado Carlos Eduardo Dantas Costa, mestre em Direito do Trabalho pela PUC/SP e professor da FGV/USP, que falou das “Perspectivas de futuro para o Direito Sindical” e do papel das entidades frente aos desafios atuais da estrutura sindical brasileira, novas funções e formas de atuação. A debatedora foi a juíza Beatriz Capucho.

O professor parte do pressuposto do sindicato com serviço ( SaaS – Sindicato as service) e de uma necessidade de repensar o direito sindical , que não evoluiu, segundo ele. Para Carlos Costa é urgente que se repense as formas de custeio e as próprias pautas das unidades sindicais.

 

Captura de tela de reunião, realizada de maneira telepresencial, via Zoom.
 Juíza Beatriz Capucho

 

“O número de empregados com CLT tem diminuído e há um cenário de queda de todos os indicadores sindicais. Além disso, as gerações atuais não têm interesse em trabalhar como empregado(...). A gente não tem só o direito do trabalho e do empregado – temos de olhar como um ecossistema trabalhista. O direito sindical engatinha nisso – nesses trabalhadores que não serão empregados”, ressaltou.